sábado, 12 de dezembro de 2009




"Na "Mensagem" não está explícito, mas em textos reflexivos está explícito que Portugal não é Portugal, esse pedaço extremo ocidente do continente europeu. Portugal é o sonho que teve, as viagens que fez e o modo como espalhou a língua pelo mundo.

Uma outra coisa que não gosto dos linguistas é quando alguns dizem que deveríamos deixar de chamar a língua de português. Não gosto disso. Acho que falamos português.

Veja bem, Portugal é um país da Europa. Agora toda a economia do Ocidente está em grande crise menos a do Brasil, mas até aqui o crescimento da zona do euro fez com que Portugal voltasse a olhar para o Brasil como que de cima para baixo. E eu gostava disso. Quanto mais Portugal se afirma, mais leva o Brasil no bojo, não tem outro jeito, e vice-versa. E também os outros países de língua portuguesa. Para mim, é óbvio.

Uma vez eu estava numa boite no Rio, havia uma festa para o lançamento, e chegou um grupo de garotas muito bonitas, pareciam umas cariocas bonitas. Chegaram falando comigo. E a zona sul do Rio, na verdade, é muito pequena. E eu: "Puxa essas meninas tão bonitas, e eu nunca tinha visto em lugar nenhum, incrível." Com a curiosidade, puxei mais conversa, e notei então que o sotaque carioca era forçado. Pensei: vieram do sul e estão fingindo que são cariocas.

E eram portuguesas. Quando me revelaram tomei um susto. Estavam ali fazia uma semana, pela primeira vez, e falavam como brasileiras se quisessem, de tanto verem novelas. E não eram meninas desavisadas, a roupa era elegante, eram de alta classe média, interessantes. Fiquei pensando: "Que beleza. Para onde quer que vá Portugal, isso vai."

Nunca mais vai sair do espírito português o que entrou nele pelas novelas da TV Globo. Nem quero falar na música popular, basta-me isto agora, porque a música popular faz muito mais tempo que trouxe muito, levou muito para África e trouxe muito para Portugal.

Portugal pode ir onde for. Nenhum outro país da Europa tem essa convivência com o Brasil e leva naturalmente isso. Então, a língua que falamos chama-se português."

11/12/09 Caetanho Veloso (Lisboa)

domingo, 15 de novembro de 2009

Eu não sei o que é uma casa
É um abrigo?
Ou um guarda-chuva quando chove?
Eu enchia de garrafas,farrapos, patos de madeira,cortinas, leques.
Parece que não quero abandoná-la nunca
Então é uma jaula,
que aprisiona qualquer um que passa por ela.
Mesmo um pássaro como tu, sujo de neve
Mas o que contamos um ao outro
É tâo leve que não pode ser retido no interior.

Tonino Guerra (in "Tempo di Viaggio"de A. Tarkovosky)

domingo, 25 de outubro de 2009

Outono




Outono. Os dias sombrios, as folhas caídas no chão, castanhos, amarelos torrados, verdes musgo, galhos expostos.
Gosto. O granito escurecido pelo tempo, as casas velhas, as portas de madeira que ainda sobram da barbárie, os passeios tumulares, a pedra portuguesa onde ainda resiste.
“amo-te!” meio corpo de dentro de uma porta de aço enquadrada em cantaria. Vestida de preto, uma jovem lança a palavra para alguém que estava no fim da rua. Não olhei para trás por inibição. A porta fechou-se.
O que tem isto de mais para me impressionar? Pensei logo de imediato enquanto via a montra do alfarrabista. Cheguei à conclusão que apesar de a palavra ser um lugar comum em todo o universo romanesco e novelesco do nosso dia a dia, raramente é empregue em público. Há uma inibição no uso da mesma publicamente.
Outros Outonos com este se cruzam, ou não. A mãe a insistir em ir comprar as malaguetas a Atães. E fomos. A alma a forçar o corpo até ao limite, mas este, tirano, a vencer. O Opel Corsa vermelho, a estrada cheia de buracos, as dores a sobreporem-se ao prazer. Uma “via crucis” do Porto a entre-os-rios. Deus cruel, que tudo ofende e nada respeita. E tudo por causa de umas malaguetas para fazer piri-piri. Ou talvez apenas um pretexto para viver.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Esta coisa agora da Maitê Proença... não tem importância nenhuma. A mulher é uma ignorante e limitou-se a agir como tal. Acho mesmo que é estar a dar-lhe muita importância com este barulho todo que se tem feito.
Por mera coincidência tenho tido uns amigos brasileiros aqui no Porto de férias, os quais também se mostraram chocados com as notícias. Mas acho que o caso não é para tanto, já que como disse, a mulher mostra-se como uma ignorante total, uma pessoa fútil.
O meu amigo Eduardo (carioca), que não é nenhuma estrela pública, sabe infinitamente mais sobre o Brasil e Portugal do que essa senhora das telenovelas algum dia há-de saber. E isto apenas pela simples razão que ele está interessado em compreender as coisas e não apenas em retirar ilações primárias de tudo o que vê.
Esqueçam o mais depressa possível este acidente “diplomático”.
O brasileiros são os nossos verdadeiros irmãos. Nem os africanos, muito menos os espanhóis, o povo brasileiro é o único que tem genuinamente raízes que nos unem.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Como se não basta-se ter-se ido buscar o pobre do Jorge de Sena em estado cadáver aos Estados Unidos, portanto sem se poder defender, agora é a tômbola da Amália. Primeiro enfiaram-na no Panteão, a fazer companhia ao Camões, ao Garret, ao Pessoa, enfim tudo vitimas deste poder nojento e inculto que cúpula com os seus cadáveres. Agora comemora-se os dez anos da morte da mesma Amália para fazer render mais alguns lucros a uns não sei quantos.
É claro que Amália Rodrigues é um dos fenómenos mais impressionantes no capítulo da comunicação musical dos últimos cem anos, mas todas estas efemérides não têm nada a ver com isso, mas sim com o comércio fácil do cadáver indefeso.
O fenómeno Amália só interessa verdadeiramente àqueles que foram possuídos por ela de uma maneira irracional, num dado momento, ainda que depois se possa elaborar imensa argumentação intelectual para o justificar.
Agora mesmo ouço Amália. Uma gravação dos anos oitenta. O unico problema e mesmo este não o chega a ser - a não ser num ideal de perfeição que nós próprios construímos - é que ela continuou a cantar para além do que lhe era possível.

sábado, 3 de outubro de 2009

Parece já ser certo que os irlandeses votaram sim no referendo. Depois de dizerem não, dizem sim. Claro que pelo meio toda uma chantagem do poder político no sentido de incutir medo nas massas para estas votarem da maneira que lhes convem. A pressão foi imensa. Todos os poderes dos países da união europeia se uniram no apoio ao governo irlandês nessa estratégia intimidatória, que pelos vistos resultou. É a democracia dos nossos dias em funcionamento.

O Brasil foi o país escolhido para a proxima realização dos jogos olímpicos em 2016. É uma boa notícia como é evidente. Não há país mais vocacionado para a festa do que o Brasil e sendo a cicade escolhida o Rio de Janeiro está práticamente tudo feito em relação ao enquadramento estético do evento. Mas não é só: o clima extraordinário que solta a cidade o povo receptivo e humilde que a habita e a topologia única que a caracteriza, são elementos que praticamente condenam ao sucesso esta realização. Claro que vai haver confusão, desorganização, derrapagem nos orçamentos apresentados e outras coisas no género, mas isso não é o mais importante.
Portanto… temos agora um presidente que partilha as suas interpretações pessoais sobre factos ocorridos na sua vida com o povo. Não se tratam por isso de factos concretos. Não, são sinais, idiossincrasias, suspeitas de que algo aconteceu de determinada maneira. Trata-se da interpretação dele. Aliás, admitiu até que outros terão outras. É novo e é extraordinário. Faz o país paralisar de expectativa para depois vir revelar os seus pensamentos sobre determinado assunto. Assim como uma conversa que se tem ao pequeno-almoço com a mulher.
Será que esta atitude é para manter? Poderemos contar a curto prazo com mais interpretações do presidente? Será que as mesmas se vão restringir à sua vida doméstica ou se prolongarão para aspectos culturais, como a poesia, a pintura o cinema?

sábado, 19 de setembro de 2009

O tempo passa
O tempo está a passar
Os dias são apenas uma espécie de cronómetro
Para nos controlar
Com suas regras de sucessão.
As noites também.
Apenas o tempo existe.
O tempo de vigília
O tempo dos sonhos.
O primeiro das acções
Dos gestos, da luta.
O segundo da inacção física
Da especulação inconsciente.
Um e outro dentro daquela massa viscosa dita cérebro.
Comunicam, portanto, os dois tempos.
E quando nos perdemos no tempo
É dentro de nós que nos perdemos.

domingo, 2 de agosto de 2009


Ouvir e ver este homem a tocar piano é sempre impressionante e inebriante. Porque há sempre uma dimensão física de que não nos conseguimos abstrair na maneira como se relaciona com o piano e com a musica e um encantamento pela mundo sonoro que produz de uma maneira… diria que mediúnica.
Uma palavra também para o registo das imagens que são duma total eficácia.

sábado, 1 de agosto de 2009

Chick Corea and Gary Burton


Jardins do Palácio de Cristal às 23:30 de hoje – entrada livre.
Irresistível como é evidente para quem conhece os dois músicos. Correu lindamente. Boa temperatura, bom ambiente por parte do público, excelente perfomance por parte dos músicos. Daquelas noites para não esquecer, porque são raras. Burton mais eloquente nas improvisações, os dois brilhantes nas harmonias e recursos timbricos. Corea sempre excelente no piano orquestral. Muito bem dispostos os dois, comunicando muito bem com o público. O som esteve razoável, com algumas vibrações que podiam ter sido evitadas.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Do Dia


0 sono corresponde a menos horas de vigília, não a menos horas de vida, como muitos anunciam.
Levantei-me tarde.
Saí para comer alguma coisa e sobretudo para tomar café.
Mas antes, caixa de correio. Surpresa! Carta das Finanças declarando o que vou ter de pagar relativamente ao ano de 2008. Não há melhor maneira de começar o dia.
Pela rua a caminho do café - “A nossa Joana é como o vinho! Teve as bênçãos do vinho! Ela anda a cabeleireira…”
Estava na biblioteca a ler o El País e recebo uma mensagem a dizer: “Já cá estou”
O Vaticano reabilitou Óscar Wilde, deve ser para rir esta, não? Zaha Hadid projecta um auditório em Inglaterra especificamente para ouvir música barroca e em especial Bach. Coisa incrível. Fez uma série de estudo acústicos tendo em conta o desenvolvimento da musica de Bach e projectou o auditório de maneira a revelar toda a verdade da musica deste compositor único. De corrida, no Publico, um artigo do João César das Neves sobre o Magrite a propósito do museu dedicado ao mesmo recentemente inaugurado. Um artigo sobre arte feito por um rato de sacristia é sempre irresistível. O Saramago revolta-se contra os números exibidos pelas sondagens sobre a violência exercida sobre as mulheres nos lares espanhóis. Adianta, que seria altura de os homens fazerem manifestações públicas sobre este facto, sem a presença de mulheres.
Fassbinder foi um génio. Sabia-o e cada vez que revejo as suas obras, confirmo. Berlim Alexander Platz. O cinema começou por ser uma arte. Hoje ainda o é na voz de alguns, poucos, resistentes. Na maior parte dos casos não passa de uma fábrica de produzir esquecimento. É me muito difícil acreditar no suicídio de Fassbinder. Um homem com aquela energia e criatividade transbordante não conseguia suicidar-se, muito menos aos 36 anos.
Mandaram-me uma mensagem com um áudio que circula pela Internet com uma entrevista feita por uma meninas do Piaget de Macedo de Cavaleiros e na qual se pode ouvir uma mulher viúva exposta em toda a sua intimidade. Uma coisa quase pornográfica. Achei triste, mas ao mesmo tempo um exemplo extraordinário do que ainda se passa no mundo rural actual. Mulher sem receios expondo-se totalmente, já que não tem mais nada a perder. Ressalve-se a lucidez com que identificou as meninas do Piaget como sendo uma espécie de putas, que é o que são na verdade, com todo o respeito por aquelas que ganham a vida propiciando prazer com o seu corpo e que são mais sérias do que estas do Piaget de Macedo de Cavaleiros.
Andamos toda a tarde a saltar de esplanada em esplanada, à procura de sol. È difícil encontra esplanadas no Porto onde se apanhe sol da parte de tarde. É preciso fazer uma topologia das esplanadas tendo em conta o sol e não só os fumadores. Ao fim da tarde - O céu em gradações cinza escuro em primeiro plano, laranja esbatido na camada seguinte e finalmente cinza claro.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Esplanada


Vêem-se muitos turistas na cidade. Distinguem-se uns pelo ar nórdico que exibem e todos pelo ar confuso com que recebem a mesma. Nas esquinas das ruas, casais e famílias inteiras, debruçam-se sobre mapas como se estivessem a decifrar enigmas. Olham para um lado e para o outro e as mais das vezes devem tomar o rumo do acaso, que vendo bem, é o mais próprio para quem faz turismo. Às vezes perguntam a quem passa como é que se vai para determinado sítio, mas é raro. Evitam o contacto, ainda desconfiados das gentes da terra que pisam. A maioria são espanhóis. Nos últimos anos parece que os espanhóis descobriram Portugal ou foi a crise que os mandou para cá.
Estou na esplanada e vejo-os passar. Alguns sentam-se e pedem cerveja. Nada de meias de leite ou coisa parecida. Tenho uma amiga para a qual o melhor repasto da vida é uma meia de leite acompanhada de pão com manteiga. Hábitos. O jornal é do dia anterior, mas mesmo assim dou uma vista de olhos. O pedinte do braço oculto por baixo do casaco aproxima-se das mesas e debita uma espécie de reza que ninguém entende mas toda a gente percebe.
- Um café em chávena escaldada, por favor!
Um cão vem cheirar o saco de compras que está em cima da cadeira. Há sempre cães a passar. Uns com dono outros livres.
O jornal do dia anterior. Faz 40 anos que o primeiro homem pisou a lua. Parece que ainda há gente que não acredita.
Chega um grupo de raparigas negras e ocupa uma mesa. Falam alto e riem ainda mais alto. Estão alegres e satisfeitas, vá-se lá saber porquê. O dono da casa de móveis vem à porta entreter o olhar. Olha para cima e para baixo e volta a entrar no estabelecimento vazio. Mulheres novas e menos novas olham as montras e carregam sacos de papel com as marcas das lojas. Os saldos. As carteiras vazias. A vontade irreprimível de comprar. A angústia do capitalismo falhado.
O Filipe já cansado daquela inacção começa a arrastar cadeiras da esplanada para o meio da rua. O pai complacente, observa e não diz nada. As pessoas que se encontram nas outras mesas sorriem com uma expressão nostálgica possivelmente recordando o tempo em que eram capazes de arrastar cadeiras para a rua e subir para cima de mesas.
Amstrong ligou da lua para o telefone vermelho da Casa Branca, atendeu Richard Nixon.
Levantei os olhos, mas não estava visível.
As olheiras da jovem que atende à mesa são uma espécie de buraco negro dentro do qual há vida. Quantas horas? Quantos dias? o desemprego aumenta, a escravidão anuncia-se, as humilhações… Berlin – Alexander Platz.
Com a luz de fim de dia a rua ganha uma outra visibilidade. Os edifícios tornam-se mais legíveis nas suas reentrâncias e ornamentação.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

"Minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem de grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite."
Clarice Lispector

sexta-feira, 17 de julho de 2009

FUMAR

Apeteceu-me fumar um cigarro
Preparei-me para o fazer
E de repente dei conta que já estava a fumar
Todo um questionar a vontade de fumar
De repente se apoderou de mim
Deitei fora o cigarro que fumava
Pareceu-me absurdo – o acto
Era como uma espécie de paroxismo.
E agora?
Não ia fumar, ia fazer o quê?
Eis a questão
Fumar ou não fumar
Vencer esta intranquilidade que me arrasta
Até ao fim dos dias
Não és homem nem és nada! Se…
Pois, que não sou homem já sei
E não quero
Agora que não sou nada…
Ainda estou na dúvida

domingo, 12 de julho de 2009

LA PISCINE


Para me refazer do ultimo desaire – flash-back até aos anos 70 com o filme “La Piscine” de Jacques Deray. O filme, muito falado à época, é, visto com os olhos de hoje uma pérola. Pela simplicidade, contenção, bom gosto e capacidade de contar uma história de uma maneira cinematográfica – quer dizer na qual as imagens, o que vemos, é determinante no desenrolar do processo e naquilo que vamos sentindo. O Ciúme ou a necessidade de posse pode ser o tema do filme, mas para além disso temos o extraordinário prazer de ver essa mulher, que na verdade não é uma mulher, mas sim uma deusa, que é Romy Schneider. Jacques Deray, o realizador, sabe-o e filma-a como poucos a conseguiram filmar. A câmara lê-a em certos momentos. Lê o seu corpo sem conseguir penetrar na sua mente, é certo, mas a ideia é também deixar essa ambiguidade espalhar-se. Se este filme não fosse mais do que isto, já valeria a pena. Ver Romy a descer as escadas da casa no seu fato de banho branco, ou a ouvir musica esticada no sofá, ou a sair da piscina, ou a dormir, só isto valia o filme todo. Exagero? Não! Vejam, o porte, a elegância, o equilíbrio das formas, tudo, o máximo da perfeição.
Mas também há o Alain Delon no seu máximo, quer de apresentação física, quer de representação.
A escolha de Romy Schneider para a protagonista deste filme é especiamente feliz, tratando-se de um tema que tem a ver com a posse, porque ela era o tipo de mulher que deixava sempre um rasto de insegurança nos homens com a sua beleza extraordinária.
Também no filme, embora com uma participação secundária a jovem Jane Birkin.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

ELEGY


Vi o filme hoje à noite, depois de ter lido várias criticas favoráveis. Fraco, muito fraco. Um tema já gasto em cinema, com as suas variações é claro, mas já gasto. Não é cinema – é mais televisão que cinema. Processos narrativos paupérrimos, sem um gesto, um movimento de câmara, um plano que te deslumbre. Tudo lugares comuns. As praias enubladas, o homem reflexivo por dentro da janela observa a chuva, as mamas da Penélope Cruz… mesmo Ben Kingsley que é um dos grandes actores da sua geração, não se mostra lá muito à vontade no papel. Quem não esteve mesmo bem foi esta Isabel Coixet que assina o filme. Uma lamechice para a família cristã.
Poupem o vosso dinheirinho e vejam na televisão que é o melhor.

Pinto Monteiro

O Procurador-geral da República, Pinto Monteiro, mostrou-se ontem preocupado com o que caracteriza ser um cerco às liberdades individuais em nome da segurança. Num seminário na Universidade de Coimbra, Pinto Monteiro disse que hoje há cada vez mais “medidas excepcionais”. “Temos as buscas domiciliárias nocturnas, casos excepcionais de investigação, vigilâncias de rua”, disse.

“Pouco a pouco há uma espécie de pequeno cerco a determinadas liberdades individuais, que o cidadão em nome da segurança aceita”, acrescentou Pinto Monteiro. “Penso que é um perigo ir por aí”.

“A liberdade sempre tem de ser tida em primeiro lugar, ou pelo menos numa situação de igualdade, aliás como exige a nossa constituição”.

“Em nome da segurança não podemos esmagar a liberdade do cidadão. E em nome da liberdade não podemos descurar a segurança individual. É um equilíbrio difícil. Seria mau esmagar a liberdade para impor uma segurança reforçada”

Finalmente alguém com responsabilidade diz algo que ultrapassa o politicamente correcto

quinta-feira, 9 de julho de 2009


No espaço de cem metros, duas farmácias. As duas com bom aspecto, preocupação com as cores que as decoram, com as montras, com o espaço interior. Numa delas existem sofás para as pessoas descansarem enquanto esperam. Um pouco mais à frente, um novo conceito, que eu não conhecia, a Farmacar. Consiste numa estrutura preparada para fornecer medicamentos a pessoas que se deslocam até lá de carro. Extraordinário, não é? Pelo centro da cidade nascem e crescem Clínicas e Laboratórios de Análises. O negócio prospera com a cumplicidade de médicos e de uma população que faz da doença um curriculum vitae. Não sei se já repararam que agora por tudo e por nada se manda fazer análises, ecografias, colonoscopias, mamografias, etc.
Não sei se também repararam a quantidade de pessoas que se deslocam de muletas como se estas fossem mais um adereço que as qualifica, como o telemóvel, o relógio, ou outro qualquer. Isto porque quando as observamos atentamente reparamos que não se apoiam nas ditas muletas, mas sim que as transportam. São estas muletas adquiridas nos centros de saúde, local no qual muitas pessoas passam tardes e manhãs que oscilam entre a resmunguice e o convívio fraternal.
Agora com a Gripe A, todo um novo rosário de queixas e medos vai ganhar forma e esperemos que não acabe em histeria colectiva.
Bons tempos para a industria farmacêutica e profissões a ela ligada.
A venda de Tamiflu dos laboratórios Roche, já esgota em muitas farmácias e na Internet à algum tempo e ainda estamos no começo.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

OLHARES

É interessante como as pessoas têm dificuldade em demorar o olhar umas nas outras. Este facto nota-se com mais evidência nos transportes públicos, ou nos cafés e, enfim, em todos os sítios públicos em que as pessoas se encontrem confinadas a um espaço. E é tanto mais interessante, quanto as mesmas pessoas olham compulsivamente umas para as outras na rua – portanto em espaço aberto.
Os homens olham sobretudo para as mulheres. As mulheres olham sobretudo umas para as outras e por vezes também olham para os homens. Mas estes olhares têm significados diferentes. O dos homens é primário, têm a ver com o desejo imediato que esta ou aquela mulher lhe suscita. O das mulheres, umas para as outras, têm a ver com a rivalidade na disputa pela atenção dos homens e portanto com a sua performance visual no espaço público. O olhar que por vezes dispensam a certos homens ou corresponde a uma apreciação de um determinado tipo físico ou o mais das vezes a demonstrar um interesse que espera ser retribuído.
Mas todo este jogo de olhares é feito com uma rapidez incrível. Demorar o olhar tem má conotação. É muito descaramento. Ou é afinal medo? Medo de não ser correspondido.
Olhar nos olhos então, é problemático. Ninguém olha nos olhos. Deve ser por isso que tanta gente anda de óculos escuros.
Olha-se para os pés, para as mãos, para as pernas, para a barriga, mas do umbigo para cima há um interdito qualquer.
Aqui há alguns anos uns amigos brasileiros que estavam cá de férias comentaram comigo como estranhavam o olhar das pessoas. “Gente! Como vocês se olham!”
E é verdade. Sente-se um olhar pouco saudável nos transeuntes. Julgo que é a este olhar que alguns chamam o olhar de inveja. Não sei se estou muito de acordo com a designação mas que é doentio é.
Foi hoje posto à venda, dia 7 de Julho, o último livro de Miguel Sousa Tavares. O facto mereceu ampla divulgação nas duas últimas semanas em vários meios de informação, dando direito até a uma entrevista de fundo na revista Visão com o autor. Como nos dois livros anteriores a máquina de propaganda esteve bem montada.
Ao fim da tarde quando me tive de dirigir ao balcão de um café para pagar o mesmo, lá estava um lote de postais à beira da caixa registadora que anunciavam o lançamento do livro.
Com tanta perseguição resolvi ir à Fnac dar uma vista de olhos.
O livro chama-se “No Teu Deserto” e por baixo do título em letras mais pequenas anuncia que se trata de um “quase romance”.
Portanto não se trata já de um romance histórico, como os anteriores, mas de uma história que anda entre o real e a ficção. Quer dizer, coisas que ele viveu na sua travessia do deserto, às quais acrescenta, retira e inventa. O livro é escrito a duas vozes. A dele e a de uma rapariga mistério que conheceu nesta viagem pelo deserto. É escrito a duas vozes mas por uma só mão, que é a dele, já que a rapariga parece que até já morreu.
Das páginas que li ficou-me a ideia de uma escrita medíocre que vai relatando os percalços e os momentos de prazer desta viagem sem se coibir de um egocentrismo e narcisismo que lhe está latente, principalmente nas partes em que fala por ela e da experiência extraordinária que foi para ela conhecê-lo.
Os livros anteriores, para além das polémicas, estão protegidos pela investigação histórica sobre os factos de que fala, mas agora que se arriscou numa história pessoal ficou mais exposto o seu génio para a escrita, para a criação literária.
É claro que o livro vai vender imenso. Tem até a vantagem de ter poucas páginas e ser mais barato do que os outros. Mas não é por isso – é que fica bem ter o último livro do Miguel.
Tal como existem as Santanetes e as Socranetes, também existem as Migaletes.

quinta-feira, 2 de julho de 2009



SOZINHO COM O MEU CORPO

Agora estou sozinho com o meu corpo
Marcas, rugas, feridas
Pronto a ser história

Agora estou sozinho com o meu corpo
Libidinoso, apático, febril
Pronto a ser massa

Agora estou sozinho com o meu corpo
Gestos, cheiro, ruídos orgânicos
Pronto a ser máquina

Agora estou sozinho com o meu corpo
Pele, pelos, unhas, lixo
Pronto a ser bicho

Agora estou sozinho com o meu corpo
Lavado, perfumado, reluzente
Pronto a ser imagem
Manuel Pinho, ministro das finanças de Portugal, foi demitido do governo por fazer um gesto considerado ofensivo para a bancada dos comunistas. Hipocrisia instalada, hipocrisia total. O primeiro-ministro vem com falinhas mansas pedir desculpa em nome do governo. A oposição aproveitou o facto, como é evidente, para tentar afectar o governo e conseguiu. O governo acusa uma fragilidade evidente ao demitir um ministro por uma razão destas. Uma vergonha que denuncia o estado e a qualidade dos políticos que temos.
O gesto em questão do ministro, foi pôr os dois dedos indicadores de cada mão, um de cada lado da cabeça, numa simbologia comum que se associa a um par de cornos.
Queria dizer nesta noite quente e apesar de tudo igual a todas as outras que estou contigo Manel. Não sei se foste um ministro extraordinário, mas sei que foste um ministro autêntico, com gafes a torto e a direito e nada preocupado com o politicamente correcto. Tudo menos um politico de carreira e hipócrita tipo Sócrates.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

O Michael Jackson morreu. Esqueçam.
A bailarina - coreógrafa Pina Baush também morreu, poucos dias depois dele. Perda muito maior e irreparável como todas as que têm a ver com o génio a criatividade e a vontade de dotar a vida de novas linguagens de novos significados.
Além do mais era muito mais nova do que ele nos seus sessenta e tal anos carregados de rugas e de ossos expostos que compunham uma beleza espectral difícil de igualar.
Esteve várias vezes em Lisboa. Via há alguns anos na Gulbenkian num espectáculo inesquecível no qual aparecia breves minutos que eram suficientes para deixar o seu perfume a sua marca em tudo que se desenrolava de seguida. Algo parecido com a sensação que tive quando vi o primeiro concerto de Miles Davis no Coliseu de Lisboa. Também não esteve muito tempo em palco, mas mesmo quando não estava – estava, não sei se me faço entender? Não? É porque não viram. Se tivessem visto percebiam.

CINEMA

terça-feira, 30 de junho de 2009

New York

No dia 28 de Junho, a Sic Noticias estreou um programa com a assinatura e a apresentação de Pacheco Pereira chamado - “Ponto Contra Ponto”. Este programa é apresentado sensivelmente à mesma hora do de Marcelo Rebelo de Sousa no canal 1. Não foi por acaso, claro está, mas por isso mesmo é muito interessante analisar as diferenças abissais das duas propostas. Uma destina-se ao espectáculo da informação, às verdades mais ou menos evidentes, à massificação do discurso. O outro à clarificação da informação, ao estimulo intelectual, à descoberta do que está por trás da informação. O primeiro é o do Marcelo e o segundo de Pacheco, como me parece obvio.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Desabafo

Eu disse-lhe, Sim! Mas sentia o til do não a subir-me pela garganta acima em direcção à boca. Sentia uma irritação, uma vontade de tossir enorme. Eram as arestas do dito til a rasparem-me as paredes da garganta. Mas acabei por dizer, Sim! E até me pareceu ficar mais aliviado. Mas não. O N o A e O a pairarem-me dentro da cabeça, com o til como uma nuvem negra a parecer querer copular o A e o O ao mesmo tempo, não me deixaram em paz. E agora, que fazer? Como manifestar o Sim exteriormente com o Não a possuir-me interiormente? Já sei! Digo Não? E como é que vou suportar a sedução do S com as suas curvas insidiosas, a sua tranquilidade enganadora? Como? Como é que vou suportar esta angustia de não haver nada no meio tipo… SÃI? Condescendendo até no til, que como já disse é uma coisa que arranha a garganta?

sexta-feira, 5 de junho de 2009

“Quando nada faço, é quando estou mais activo e é quando estou totalmente comigo mesmo que estou menos só.”
Catão o Antigo (Roma 234 a.C. – 149 a.C.)

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Como não vejo televisão não assisti à peixeirada de que tanto se fala da Manuela Moura Guedes com o Bastonário da Ordem dos Advogados. Mas hoje em dia nada se perde, tudo se transforma em outra coisa. Vai daí fui ao youtube que é um sítio onde os factos se transformam realmente em outra coisa. Lá estavam os dois a dar o seu espectáculo, com a vantagem de que no youtube se apanham sobretudo os momentos de orgasmos – quer dizer – o que está antes e o que vem depois não interessa, apenas o apogeu da coisa é relevante. Não há tempo a perder. O que me pareceu? Uma enorme palhaçada, como é evidente. A Manuela igual a si própria e o bastonário com uma boa prestação, aliás trata-se de um razoável actor, que esteve bem no seu papel de indignado com as observações da locutora como se não soubesse de antemão que era aquilo que o esperava. Portanto foi lá precisamente para armar a tal peixeirada com a ajuda da Manelinha. Acho que correu bem aos dois, apesar de um maior protagonismo dele.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

CRAMOL


Um grupo de mulheres, cerca de vinte, insistem à mais de vinte e cinco anos em manter um projecto de música etnográfica de cantos polifónicos ligados à voz feminina. Fazem-no bem - cada vez melhor. O grupo chama-se “Cramol” e é uma prova de resistência dentro da lixeira mediática a que todos estamos expostos. Lançaram agora o segundo disco, em 25 anos, o qual se chama “Vozes de Nós”. A ideia inicial era nem entrarem neste circuito dos discos, mas acabaram por ceder às solicitações. A não perder, de preferência ao vivo, como é evidente.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Bénédicte Houart


Foi minha professora de estética. Alta, magra, sempre de escuro, discorria sobre a “Critica do Juízo de gosto” de Kant. Tinha uma coreografia muito própria de braços e mãos, sobretudo nas longas pausas que fazia na procura das palavras certas para uma melhor compreensão das ideias do filósofo alemão.
De repente desapareceu. Deixou de dar aulas. Vive em Coimbra e escreve poesia. Saiu agora o seu terceiro livro que se intitula “Aluimentos”. Linguagem solta, agreste, que mata com doçura.

terça-feira, 12 de maio de 2009


“O objectivo da vida é o desenvolvimento próprio, a total percepção da própria natureza, é para isso que cada um de nós vem ao mundo. Hoje em dia as pessoas têm medo de si próprias. Esqueceram o maior de todos os deveres, o dever para consigo próprios. As suas almas morrem de fome e estão nuas. A coragem desapareceu da nossa raça e se calhar nunca a tivemos realmente. O temor à sociedade que é a base da moral e o temor a Deus, que é o segredo da religião, são as duas coisas que nos governam. E no entanto, acredito que se um homem vivesse a sua vida plenamente, desse forma a cada sentimento, expressão a cada pensamento, realidade a cada sonho, acredito que o mundo beneficiaria de um novo impulso de energia tão intenso que esqueceríamos todas as doenças da época medieval e regressaríamos ao ideal helénico. Mas o mais corajoso dos homens tem medo de si próprio.
A mutilação do selvagem sobrevive tragicamente na auto-negação que nos corrompe a vida.
Somos castigados pelas nossas renúncias. Cada impulso que tentámos estrangular, germina no cérebro e envenena-nos.”
Óscar Wilde

quarta-feira, 6 de maio de 2009


A Uma Amiga

Falava com ela como com uma mulher qualquer. Mas não era. Não era uma mulher qualquer. Às vezes surpreendia-me a vela chupar no dedo polegar da mão direita. Era fascinante ouvi-la falar dos livros de Sherlock Holmes e justificar cientificamente (dada a sua formação) como tudo era genialmente construído. Apesar da sua expressão revolucionária, vestia como uma aristocrata – veludos e rendas eram habituais nas suas indumentárias disfarçadas por jeans coçados. Não usava anéis, o que era uma das suas virtudes, já que tinha umas mãos perfeitas. Gostava de conversar. Às vezes estávamos os três e acabava-mos a noite com a boca seca de tanto falar. Bebia-mos vinho, ou whisky, conforme o que havia e então é que era falar, falar, pela noite dentro. Estava-mos às vezes em desacordo, creio que mais para espalhar a reflexão do que seriamente em desacordo, mas estes eram sempre os momentos mais virtuosos da conversa.
Um dia, deixas-te ficar cá em casa um cinto que cingia o teu vestido de veludo bordeaux. Ainda cá está e estará, até que tudo se decomponha e se organize de maneira a ir de novo ter contigo.
"Não poderá a doutrina molecular ser tão útil na organização e extensão do nossso conhecimento do comportamento das coisas observáveis, e, contudo, ser factualmente falsa?"
W. Quine

terça-feira, 5 de maio de 2009

Lembram-se de há uns meses ter falado no livro de Adriana Lisboa – “Rakushisha”? Pois agora aqui vai um excerto do mesmo lido pela própria Adriana
Cortejo da Queima das Fitas. Confusão no centro da cidade. O tempo está bom o que ajuda na deslocação a pé dos entusiastas do evento. No que toca aos carros o mesmo não se pode dizer. Senhoras bem vestidas com rostos resplandecentes e coradinhas afluem ao centro urbano para ver os filhos desfilarem. Estão felizes. Os estudantes circulam de um lado para o outro com as suas cartolas, bengalas e camisolas que anunciam os respectivos cursos. A meio da tarde ainda se mostram tímidos e pouco ruidosos, mas com ar de ansiarem o fim de tarde e a noite que trará consigo o álcool suficiente para conseguirem emancipar, por algumas horas, a sua alegria e vontades mais primárias. Nada de novo, portanto, mas o que caracteriza este tipo de acontecimentos é precisamente o não apresentarem nada de novo, seguirem uma tradição.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

quinta-feira, 30 de abril de 2009


AVS
Vou me embora. Parece que vai estar bom tempo nos próximos três dias e vai daí – vou me embora. Espero que todos fiquem na paz do senhor e sobretudo que se contenham nos vossos ímpetos mais lascivos e busquem a redenção por todos os meios. O Amor em Santo Agostinho vai ser o motivo da minha reflexão por estes dias.

quarta-feira, 29 de abril de 2009


“E, tendo aberto o sétimo selo, fez-se silêncio no céu, quase por meia hora. E vi os sete anjos, que estavam em pé diante de Deus; e foram-lhes dadas sete trombetas. E veio outro anjo, e parou diante do altar, tendo um turíbulo de ouro; e foram-lhe dados muitos perfumes, a fim de que oferecesse as orações de todos os santos sobre o altar de ouro, que está diante do trono de Deus. E o fumo dos perfumes das orações dos santos subiu da mão do anjo até à presença de Deus. E o anjo tomou o turíbulo, e o encheu de fogo do altar, e o lançou sobre a terra, e houve trovões e vozes, e relâmpagos, e um grande terramoto. Então os sete anjos, que tinham as sete trombetas, prepararam-se para as tocar.”
Apocalipse de S. João

terça-feira, 28 de abril de 2009


A pandemia está aí! É o fim do mundo! Primeiro a crise, agora a gripe suína, estamos feitos. É o apocalipse. Estava tudo escrito e ninguém quis saber. É o final dos tempos e o México aqui tão perto – à distância de um espirro. Fechem as fronteiras! Isolem os tipos que dão mais de dois espirros por segundo. Vigiem os vossos vizinhos. Não apertem a mão nem ao melhor amigo. Evitem o contacto com o outro. Lavem-se frequentemente. Rezem. Os que não souberem aprendam, existem Bíblias a preços módicos nas livrarias Salesianas e na Fnac. Preocupem-se. Entrem em pânico que o caso não é para menos. Encomendem as vossas almas que ainda não é tarde.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Serviço Público
Gripe Suína (malditos porcos)
Vírus H1N1
A organização mundial de saúde subiu o nível de alerta para nível 4 o que significa risco de pandemia. Em Portugal o governo garante que não há registo de casos nem suspeitas de infecções, tal como aliás, bem vistas as coisas não existe crise nenhuma. A ministra da saúde garantiu que os dois milhões e meio de tratamentos que existem chegam para qualquer eventualidade.
Quais os sintomas desta gripe?
Dores no corpo, tosse, espirros, como em qualquer gripe, mas no caso deste tipo H1N1, existem dois sintomas particulares: o vómito e a diarreia.
E cura?
Só dentro de quatro a seis meses haverá uma vacina, no entanto existem dois medicamentos anti-virais: o Tamiflu e o Ralensan.
Para esclarecimento de dúvidas ligar para o 808 24 24 24 (linha saúde 24)

domingo, 26 de abril de 2009


È evidente que tendo em conta o caminho que as coisas levam, o que quer dizer as opções do poder vigente, tem pouco sentido ou nenhum andar a despertar as pessoas para os benefícios da expressão artística, ou para os benefícios da critica e especulação racional proporcionados pela filosofia. O que mais me incomoda no processo é o não assumir deste facto por parte dos executores. Tendem a encarar as ditas disciplinas com algum paternalismo que as esvazia da sua razão original e a transformá-las em algo de supérfluo. Isto tudo à mistura com a ignorância do povo, com o qual contam a seu favor, vai resultar numa lenta agonia das ditas. Só não se extinguiram em definitivo, porque os seus produtores fazem-no não por opção mas por necessidade absoluta.

sexta-feira, 24 de abril de 2009


25 de Abril. Curiosamente o tempo está idêntico ao daquela manhã em que fui mandado embora do colégio sem grandes explicações. Em casa também não as houve. Fui me apercebendo aos poucos do que acontecia sobretudo pelas reacções quer das pessoas da família quer das pessoas da rua. Mas é interessante reviver agora o processo já que a memória que tenho dos primeiros dias é de uma estranha calma. Pouca euforia, muita desconfiança e por fim lá veio a algazarra já próximo do 1º de Maio. A principal excitação, já na altura, veio pela televisão e pela rádio. E o que chegava era tudo a falar ao mesmo tempo, confusão portanto, um grupo de militares sentados a uma mesa em pose, preparados para falar ao povo através da televisão. Tento lembrar-me das sensações de rua naqueles primeiros dias e não me lembro de nada de excepcional, aqui na zona onde moro é claro - centro do Porto. Nem de gente aos berros na rua a gritar a revolução, nem de rostos de alegria, não me lembro de nada disso. Houve um recato desconfiado nos primeiros dias. Como disse, a excitação vinha toda da televisão. E a televisão assim conduziu já na altura os nossos movimentos e as nossas sensações. Imagine-se então o que terá sido a recepção da revolução por esse interior adentro. A revolução deu-se em Lisboa e de Lisboa propagou-se ao resto do país pela rádio e pela televisão. O meus pais eram vivos e estavam comigo, mesmo não me explicando coisa nenhuma estavam. Os meus irmãos, o que inclui duas e um, estavam todos casados e por isso não comigo. Viviam já as suas “tragédias” pessoais. Amigos não tinha. Vivi portanto na solidão da minha interpretação esta data que não teve em mim nenhuma espécie de estremecimento emocional.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

SEIS MULHERES (não comuns)


Seis mulheres excepcionais no desempenho das suas vidas. Umas com obra reconhecida, outras excepcionais apenas pela vida que tiveram (fizeram), o que já não é pouco convenhamos. Aliás, o ponto de partida do meu interesse foi a obra de algumas delas, mas com o tempo o que se tornou mesmo fascinante foi a descoberta dos percursos existenciais de cada uma. Várias coisas têm em comum, mas uma delas é evidente – a coragem com que enfrentaram a sociedade, que em alguns casos não chegou para enfrentar a vida.
Virgínia Woolf (1882-1941)
Florbela Espanca (1894-1930)
Hanna Arendt (1906-1975)
Annemarie Schwanzenbach (1908-1942)
Etty Hillsuman (1914-1943)
Sylvia Plath (1932-1963)

Fátima Guedes

Para aliviar um bocadinho a coisa...
Há muitos anos descobri uma cantora brasileira chamada Fátima Guedes que me fascinou pela novidade do discurso, quer musical quer poético, quer ainda pela interpretação intensa e introvertida. Compositora, interprete e letrista da maior parte das músicas que executava, transmitia uma frescura no discurso que era na sua maior parte um discurso intelectualizado. Elis Regina descobre a sua obra e logo a adopta munida da sua intuição musical profunda, como fez aliás em outros casos. Entretanto o tempo passa e a rapariga desapareceu do mundo mediático musical durante anos. Agora com esta oportunidade que o youtube nos dá de rever coisas antigas e até procurar por pessoas que desapareceram encontrei-a de novo. Mais velha, como é evidente, mais gordinha, mas o génio está lá. Em entrevistas que entretanto tive oportunidade de ver com ela pareceu-me ter percebido que o que aconteceu é que a mulher foi ostracizada por razões que não me apetece agora explanar.
O youtube tem vários vídeos da apresentação de um disco novo dela. Escolhi este porque é um samba do Jobim e é um momento de alegria na voz de uma grande interprete. Para quem não a conhece, não deixar de procurar as composições mais antigas e intimistas de Fátima Guedes.

quarta-feira, 22 de abril de 2009


Qual ancestral fala através de mim?
Eu não posso viver ao mesmo Tempo com a minha cabeça e o meu corpo. Por isso não consigo ser uma só pessoa. Sou capaz de sentir infinitas coisas ao mesmo tempo.
O grande mal de nosso tempo é não haver mais grandes mestres.
A estrada do nosso coração está coberta de sombras. Devemos, ouvir as vozes que parecem inúteis...E que no cérebro cheio de coisas aprendidas na escola, no asfalto e na prática assistencial,...e com o zumbido dos insectos que entram na minha orelha.
Precisamos encher os olhos e as orelhas daquelas coisas que existem no início
de um grande sonho.
Todos devemos gritar que construiremos uma pirâmide,...não importa se não a construirmos! O que importa é alimentar os desejos. Temos que tirar a alma de todas as partes como se fosse um lençol que cobre o infinito.
Para o mundo ir em frente, devemos dar as mãos, misturar os assim chamados sãos,...
com os que são chamados doentes.
E vocês sãos, …o que significa a vossa sua saúde?
Todos os olhos do mundo vêem o precipício em que estamos caindo.
A Liberdade é inútil se não tem coragem de olhar com os olhos da cara, e de comer connosco, e de beber connosco e de dormir connosco!
Os assim chamados sãos, foram os que conduziram o mundo para a catástrofe.

Homem, escuta!
Em ti, água, fogo e depois cinzas. E os ossos dentro das cinzas.
Os ossos e as cinzas!
Tarkovsky

terça-feira, 21 de abril de 2009

Hanna Arendt


(…) Aquele a que chamamos o «burguês», é um homem moderno, homem de massas, não observado nos momentos de exaltação em que partilha a excitação das massas, mas em sua casa, em segurança (hoje diríamos mais insegurança) do seu domínio privado. Levou tão longe a separação entre o privado e o público, o trabalho e a família, que já não consegue descobrir em si próprio qualquer ligação entre uma coisa e outra. Quando a sua profissão o leva a matar, não se considera um assassino, porque o seu acto não resulta de uma tendência pessoal, mas de uma aptidão profissional.

segunda-feira, 20 de abril de 2009


Do que é que somos feitos?
De carne, ossos, líquidos, plasmas, uma série de substâncias viscosas e pensamento.
A importância que cada uma destas partes tem no nosso dia a dia é estupidamente desigual.
Que importância têm as minhas pernas durante o dia a não ser o de executarem o que o córtex cerebral as mandam executar, ou as minhas mãos, ou o meu tronco e por aí adiante. Que tempo da minha atenção lhes presto a dignifica-los? Sei que existem e existem mais quando me doem ou causam qualquer tipo de problema.

O desprezo pelo corpo é uma característica cultural do ocidente. E não falo como é evidente de cosméticas e vaidades mais ou menos exageradas. Falo do sentir as partes como um todo, do ter consciência de cada parte do nosso corpo.
Pichagem nas paredes pelas quais passo a caminho de casa. Dizem revolta, mal estar, ironia, desprezo, vómito, mas ninguém se encontra lá, são anónimas como o medo global.

sábado, 18 de abril de 2009


A.S.

Arte - Em Miguel Bombarda (do lado de fora)

Sábado de chuviscos e céu enublado. Por entre a neblina a crise paira e toda a gente disfarça o melhor que sabe. Na Miguel Bombarda grupos de pessoas jovens e menos jovens, passeiam alegremente os seus egos pela rua numa tentativa episódica de parecer outra coisa que não aquilo que são. Perdão, não passeiam, deslocam-se e deslocam-se com uma certa ligeireza, pois a lentidão pode revelar o que tanto se esforçam por esconder. E depois há o patrocínio de um whisky qualquer que tudo vai remediar. Elas, têm um olhar de curiosidade que logo passa a um olhar de defesa duro e implacável. Eles, um olhar perdido de quem não sabe bem qual o seu papel, entre o macho seguro e o suicida. Tudo se desenrola numa aparente leveza, mas a tensão está lá em cada gesto, em cada olhar. Muitas exposições, grande parte delas colectivas o que denota uma certa paragem no trabalho dos artistas ligados às galerias. Devem estar deprimidos.
Uma análise das tipologias presentes neste “happening”, como é agora chamado por alguns a esta feira de vaidades mostra que a tessitura da mesma se alarga e isto é o que de mais positivo há a registar. Já não assistimos somente ao desfilar daqueles jovenzinhos todos vestidos mais ou menos de igual, com o mesmo tipo de penteados e de adereços com os quais julgam se qualificar na ordem dos artistas ou pseudo-artistas e às senhoras e senhores bem vestidos(as) que não levam o caniche porque já perceberam que isso cai mal, mas temos agora uma nova classe emergente de desesperados que se calhar entenderam que aquela situação tem a ver com eles também e aparecem para usufruir. Afinal o whisky é de graça e em alguns sítios dá até para comer alguma coisa. Os verdadeiros artistas nem velos, como é claro. Trata-se afinal de um arraial no meio de uma cidade provinciana. A minha esperança é que o grupo destes emergentes de que hoje dei conta aumente exponencialmente e transforme esta coisa numa verdadeira festa sem vaidades de gente que ainda por cima não as pode ostentar.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Das Formas


Lee Miller (1938)
" Sempre que, através do desemprego a sociedade atinge o homem, no seu funcionamento normal e no respeito que normalmente tem por si próprio, prepara-o para essa última etapa em que ele se dispõem a assumir qualquer função que seja, incluindo a de carrasco."
Hanna Arendt

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Só os sentidos podem curar a alma, assim como só a alma pode curar os sentidos.

Peter Zumthor



Capela de St. Nikolaus e Termas de St. Nicolaus
Peter Zumthor (Suiça)
Prémio Pritzker
Obras poéticas que marcam espiritualmente o espaço que habitam
Arquitecto com um mundo e um tempo próprios que não se expõe ao vedetismo.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

A política transformou-se numa gestão, mais ou menos eficiente, da distribuição da riqueza com vista a disfarçar o desemprego e favorecer o consumismo. Isto mesmo tem sido a politica nos últimos dez, quinze anos. Primeiro levaram as pessoas a acreditar que através dos créditos bancários e das compras a prestações as pessoas teriam acesso a uma série de bens, quer os imprescindíveis quer os supérfluos. Isto durou anos e governos sucessivos de especulação, de cheques sem cobertura, de especulação na bolsa, de irrealismo puro. Até que o ciclo terminou e agora chegou o momento da crise e o poder tem a capacidade de fazer acreditar as pessoas que a culpa no fundo foi delas, porque não se deviam ter endividado, porque aldrabaram até mais não poder, trabalharam pouco e no caso dos funcionários públicos que se baldaram o mais que puderam, como se essa não fosse a atmosfera que eles próprios criaram e na qual viveram impunes. O pior disto tudo é que as massas sentem mesmo essa culpa como sendo delas o que transforma a sua reacção numa apatia patética que engrandece os novos reformadores que não passam de gestores financeiros na melhor das hipóteses.
Brown - Sócrates - Sarcosi - o que se entende agora por políticos - gente com formação cultural limitadissima, com grande capacidade de resistência física, preocupados com a gestão da sua imagem pública, profissionais na relação com os media.

Sem titulo - Mark Rotcko
O verdadeiro mistério do mundo é o visível e não o invisível.

domingo, 12 de abril de 2009

O Homem do Violino

O que foi diferente na situação é que o homem tirava um som de grande qualidade do instrumento. A princípio pensamos tratar-se de mais um dos muitos pedintes que assolam a cidade e tratamos logo de nos envolvermos no que estávamos a fazer e sobretudo não olhar para ele para não dar azo a qualquer tipo de diálogo. Mas a certa altura tornou-se impossível não olhar o homem e ele estava a tocar junto à nossa mesa. Percorri os bolsos em buscas de uma moeda para lhe dar, uma que não o humilha-se a ele nem a mim. Não é fácil já que é muito subjectivo, mas parece que ficamos os dois bem. Perguntei-lhe se era romeno, disse que sim. Era professor de música na Roménia e tem 65 anos. A pele escura, os olhos pequenos e cintilantes, sorriso meigo e cativante. Continuou a tocar andando pelo café. As pessoas que estavam dentro do café nesta sexta feira santa não resistiram à presença desta pessoa e da sua música. Todos tinham um sorriso na cara e olhavam-no com alguma surpresa.
Longe de casa, da pátria, dos amigos, um homem com um violino alegra um pouco os nossos dias cinzentos.

sábado, 11 de abril de 2009

E ela veio, no seu esplendor barroco, na sua placidez aristocrática. Molhámo-nos, ungimo-nos e usámos a palavra como revelação de nós próprios.
Conhecer uma pessoa é sempre um acto de transcendência.


“E eis que se deu um grande terramoto. Porque um anjo do Senhor desceu do céu, e, aproximando-se, revolveu a pedra, e estava sentado sobre ela; e o seu aspecto era como um relâmpago; e o seu vestido como a neve. E, pelo temor dele, aterraram-se os guardas, e ficaram como mortos.
Mas o anjo, tomando a palavra, disse às mulheres: vós não temais, porque sei que procurais a Jesus, que foi crucificado; ele já aqui não está, porque ressuscitou, como tinha dito.”
Evangelho Segundo S. Mateus

Sexta-Feira Santa

"Depois, sabendo Jesus que tudo estava consumado, para se cumprir a Escritura, disse: Tenho sede. Então, ensopando no vinagre uma esponja, e atando-a a um hissopo, chegaram-lha à boca. E Jesus, tendo tomado o vinagre, disse: Tudo está consumado. E, inclinando a cabeça, rendeu o espírito."
Evangelho Segundo S. João

Velásquez

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Tempo de Quaresma




“Desde a hora sexta até à hora nona, houve trevas sobre toda a terra. E, perto da hora nona, exclamou Jesus em alta voz: Eli, Eli, lamma sabacthani? Isto é: Deus meu, Deus meu, porque me abandonaste?”
Evangelho Segundo S. Mateus
Ontem foi noticia de capa de jornal o facto de várias agências de viagens do país terem declarado esgotados os voos para destinos tropicais durante as férias da Páscoa. Numa altura em que os meios de informação se dedicam tanto à estatística, às sondagens e à investigação seria interessante saber a que classes profissionais pertencem estas pessoas. Não é difícil de o fazer nem é nenhuma invasão de privacidade, já que não interessa a identificação das pessoas para nada, mas sim a profissão que exercem. Só para perceber sociologicamente o que está a acontecer. Aliás, quando se transforma um facto como este em notícia de primeira página é porque se está a querer dizer qualquer coisa, não é assim? Então podiam ir um pouco mais longe.
Chegar à cidade depois de passar uns dias no campo provoca-me sempre um certo embaraço temporal e relacional. A agitação geral, o aumento exponencial do ruído, da poluição, a agressividade latente em toda a gente expressa nos movimentos corporais bruscos, no tom de voz e expressões faciais, torna tudo mais difícil. Claro que passadas umas horas é como se voltássemos ao nosso habitat natural – o inferno.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Solar do Outeiro


De origem medieval, é neste momento património do município de Paredes de Coura e encontra-se neste estado. O corpo principal do edifício recebeu intervenções ao longo do tempo, podendo-se observar por essa razão influências de carácter maneirista e barroco e de arquitectura dos finais do século XIX.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Paredes de Coura


Sol e chuva. O tempo passa mais devagar e torna-se mais fácil olhar para as coisas e pensar nelas. As vacas e os bois nos pastos são um exemplo a seguir. Os movimentos lentos, o olhar introspectivo, a rominação lenta. A igreja de Agualonga no meio do verde enublado. Na vila a mesma serenidade. Pouca gente e praticamente nenhuns sinais de semana Santa.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Tempo de Quaresma


Blue,Green and Brown - Mark Rothko

O Atelier


Um rectângulo que era a sala. Três janelas e uma porta. Muitas telas, resinas, cera, tintas, pincéis, papeis, lápis, lixo, discos, livros, um poster do Fernando Pessoa na porta, uma bicicleta, um computador, uma estante, cadeiras, um banco e finalmente outro rectângulo ao centro representando a mesa “eucarística”. Nesta, ganhavam forma não só as obras do artista como também nela se celebravam alguns momentos de degustação e de convívio entre pares que a memória irá guardar com toda a certeza. Acontece que tudo muda e estamos permanentemente sujeitos a forças que nos obrigam a tal e este espaço vai passar a ter uma outra utilização como já antes teria uma outra e assim infinitamente. Esperemos que um novo espaço nos faça esquecer este e assim nos ajude a suportar a perda que é afinal o destino de toda a vida humana.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Tempo de Quaresma

“Graças a Jesus aprendemos a glorificar a humildade e a esta não pode nascer de outra coisa que não seja a humilhação, senão será apenas falsa vaidade.”
Jean Genet

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Evitava olhá-los. Descia a rua sempre de olhar fixo no horizonte, o que quer dizer que olhava em frente mas sem ver ninguém em particular. Entrou no metro. Sentou-se num daqueles lugares de corredor em que as pessoas ficam umas frente às outras. Experimentou o olhar vago, aquele que permite ter uma noção geral do que se passa sem fixar nada. Ás vezes olhava para fora pela janela simulando um súbito interesse pelo exterior. Voltava a olhar para dentro. Olhava para o saco que trazia ao colo, fechava os olhos momentaneamente, fixava por momentos os sapatos, o ipod da menina que estava à sua frente, mas sem olhar para ela e voltava ao olhar vago. O olhar dos outros não tinha nenhuma importância. Eram cegos, era como se fossem.
Saiu do metro. Sentia o olhar dos outros mas não os olhava. Uma rapariga olhou-o, fixou-o, sentiu , mas não olhou para ela. Foi no semáforo frente à estação. Subiu a rua concentrando-se na respiração. Abdómen para fora, inspiração, abdómen para dentro, expiração. Parou na montra de uma livraria mas não conseguiu fixar nada do que lá estava totalmente concentrado na respiração. Parou numa confeitaria para tomar café e comprar pasteis de vitela. Olhou para a menina da caixa, pagou. Olhou para o homem que o atendeu e saiu. Na rua quatro jovens tocavam temas populares com som jazístico. As pessoas paravam. Parou também, mas pareceu-lhe ver uma pessoa conhecida no grupo dos que paravam e partiu. Foi ao sapateiro levantar uns sapatos que tinham ficado para arranjar. A porta estava aberta mas bateu assim mesmo e entrou. O sapateiro, homem de humor difícil de definir, resmungou qualquer coisa do género: "a porta está aberta não é preciso bater!", respondeu: "Era apenas para me anunciar!", disse o sapateiro: "você é bem grande! não precisa de se anunciar!". A conversa ficou por aqui. O preço do arranjo, tal como em outras vezes pareceu-lhe um calculo por alto, quer dizer, uma estimativa que leva em conta a cara do cliente. "Quanto é que devo?" resposta: "Hum..dez euros!". Pagou e saiu.
Sem comentários. A Grande Martírio.

terça-feira, 31 de março de 2009

This Is The New Shit

Marilyn Manson

Everything has been said before
There's nothing left to say anymore
When it's all the same
You can ask for it by name
Babble, Babble, Bitch, Bitch
Rebel, Rebel, Party, Party
Sex, sex, sex, don't forget the violence
Blah, blah, blah
Got your lovey-dovey sad and lonely
Stick your stupid slogan in
Everybody sing along

Are you motherfuckers ready for the new shit?
Stand up and admit it, tomorrow's never coming
This is the new shit
Stand up and admit it
Do we get it? NO!
Do we want it? YEAH!
This is the new shit
Stand up and admit it

Babble, Babble, Bitch, Bitch
Rebel, Rebel, Party, Party
Sex, sex, sex, don't forget the violence
Blah, blah, blah
Now it's you-know-who
I've got the you-know-what
I stick it in the you-know-where
You know why, you don't care

Let us
We're entertaining you
Let us
We're entertaining you

Efeito Borboleta

Um dedo na porta ou a porta no dedo é indiferente. A corrente de ar ou o vento, é indiferente. Aquele momento e não um outro antes ou depois, mas exactamente aquele momento, não é indiferente. A tontura evidente. A queda consequente. O bater da cabeça já dormente não importa em quê. O arrastar-se até à cama. O telefonema a pedir ajuda. O Hospital todo de branco. O coma eminente. O fim. O espaço e o tempo. A vida no seu estado absoluto.

segunda-feira, 30 de março de 2009

17 de Junho de 2009 Coliseu do Porto - Marilyn Manson


Dia de domingo. Muito menos gente na cidade, menos carros, tudo muito mais calmo, as pessoas mais leves. Porque é que os outros dias não são domingo?

domingo, 29 de março de 2009

Branquinho

Sim sim sim sim, é verdade, continuam a pedi-lo branquinho. Podia ter sido uma moda passageira ou coisa assim, mas não. E fazem-no empregando uma entoação que parece anunciar algum tipo de reflexão sobre o assunto, algum tipo de teste efectuado durante anos que as levou à conclusão de que branquinho é que é bom. Estilo: não me venha cá agora com isso bem cozido a parecer que foram feitos em África!
Já manifestei o meu protesto por várias vezes, mas infelizmente faço parte também nisto, duma imensa minoria que não dá lucro.
- Dê-mo branquinho, ouviu?
Isto é uma espécie de pregão que remeto ao feminino, já que me dá a impressão que o masculino no geral não especifica o tipo de cozedura e muito menos faz referência à cor do dito.
E pior, tenho constatado que algumas amigas o fazem. Ficam na lista negra, claro.
A facilidade com que as memória se rompem, com que os hábitos se transformam, a favor de uma moda que se torna uma nova memória e um novo hábito.
- As pessoas é que pedem assim! Respondem aos meus protestos os executores. Mas as pessoas também se educam, não?
- Dê-mo branquinho, ouviu?

sábado, 28 de março de 2009


Lee Miller (1930)

Das Formas

O Público e o Privado

É claro que já toda a gente experimentou o alívio que se sente ao fechar a porta de casa ao fim do dia. Despidos dos formalismos e dos comportamentos socialmente correctos damos forma à nossa liberdade individual das mais diferentes maneiras. Mas mesmo aqui, no espaço do privado, apenas quem vive só pode desfrutar dessa liberdade de “ser”. As expectativas que os outros têm de nós, dos nossos comportamentos, são sempre uma inibição à expressão da nossa liberdade individual.
Dizem que o público está a sobrepor-se ao privado. Não me parece. O que está a acontecer é que uma nova “região” da representação humana ganha forma paralelamente às outras. O virtual impõem-se progressivamente e torna-se parte do jogo dinâmico social, mas não se trata do espaço público nos termos em que este é historicamente definido. A menina inglesa de nome Jade, que vendeu a sua caminhada para a morte às redes de televisão inglesas, não se colocou no espaço público da polis, colocou-se sim num espaço virtual de dimensão universal.
A Roma Imperial está longe e longe estão os momentos em que as virtudes, mas também os desejos eram públicos. Ainda mais longe os tempos em que o chão era a terra e o tecto era o céu.
A época moderna fez da esfera privada o símbolo do bem-estar e do encontro do homem consigo mesmo, do individualismo portanto. Mas o que aconteceu é que o homem não teve nenhum encontro consigo mesmo e desenvolveu um individualismo e um narcisismo que não era próprio das massas. O espaço público vê-se por essa razão restringido num dos seus valores mais operativos que era o convívio social e participação genuína no desenrolar das dinâmicas sociais da polis.
É claro que já toda a gente experimentou o alívio que se sente ao fechar a porta de casa ao fim do dia.
Voltamos ao nosso mundo, o outro ficou lá fora – o virtual está ao nosso dispor enquanto o conseguirmos controlar.