quarta-feira, 21 de setembro de 2011


Tinha um amigo que tinha a boca em diagonal
Nunca se sabia se estava alegre ou triste
Era pau para toda a colher

É preciso recolher o lixo acumulado.
Wittegenstein tinha o lixo cheio de palavras, frases inteiras.
Uma vez escreveu no contentor – FILOSOFIA.
Os vermes riram-se – “pobre coitado” – disseram.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Nos anos setenta do século passado, Leni, percebendo que jamais conseguirá repor a sua carreira cinematográfica, dedica-se à fotografia. Por essa altura também nasce o seu interesse por África que, ao que parece lhe veio de leituras de Hemingway. Visita a tribo então desconhecida dos Nubas no Sudão. Passa algumas semanas com eles da primeira vez e na segunda alguns meses. Aprende a sua linguagem, alimenta-se e vive no meio deles, ganha a sua confiança. Para nós sobram a colecção extraordinária de fotos que fez e algumas imagens de vídeo como estas. Um olhar único sobre as coisas e as pessoas, uma estética e uma técnica difíceis de questionar e um prazer de viver sem limites.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011


Conto Infantil?

Era uma vez tudo. E neste tudo não cabia uma simples singularidade. Era tudo ao mesmo tempo. Todos presentes a expressarem-se ao mesmo tempo, humanos e animais, e todos na presença de todos. Era um todo - todo.
A princípio foi uma grande confusão. Todos a dizerem: “Eu existo, eu existo!”, multiplicado por milhões ou melhor triliões ou qualquer número assim muito grande, era insuportável.
Mas com o passar do tempo cansaram-se. E de repente houve um enorme silêncio. Um silêncio proporcional ao ruído que tinham feito, que era apenas o facto de se terem calado.
De inicio foi um pouco estranho. Ficaram todos mais ou menos parados, uns deitados, outros sentados, outros de pé. O primeiro instinto foi começarem a olhar uns para os outros com mais atenção e minucia. Os humanos para os humanos, os bichos para os bichos, os humanos para os bichos, os bichos para os humanos.
E assim se passou algum bom tempo durante o qual se olharam mutuamente. Primeiro com desconfiança. Depois com curiosidade.
Não entraram em diálogo.
Algum tempo depois, começaram a desprender o olhar uns dos outros e a olhar para o resto. O resto era o que não é animal nem humano, já se sabe.
E viram os campos os que moravam no campo, e viram as cidades os que moravam na cidade e olharam para o céu longamente e para as estrelas.
Voltaram a olhar uns para os outros e desprendeu-se deles uma certa emoção colectiva, como se por momentos tivessem estado irmanados de um sentimento comum, uns pelos outros e todos pelo meio que se sentiam habitar.
Foi um momento de grande tranquilidade e alegria. Após o qual, todos: animais e humanos voltaram a actualizar a sua postura existencial.






sábado, 30 de julho de 2011

"Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio.
Não é bastante não ser cego
Para ver as árvores e as flores,
É preciso também não ter filosofia nenhuma.
Com filosofia não há árvores: há ideias apenas.
Há só cada um de nós, como uma cave,
Há só uma janela fechada, e todo o mundo lá fora;
E um sonho do que se poderia ver se a janela se abrisse,
Que nunca é o que se vê quando se abre a janela."
Alberto Caeiro

Paredes de Coura


Ainda é sexta, mas…

Estou cá fora.
O verde tornou-se escasso
As casas ao fundo são pontos de luz
O som dos insectos é mais perceptível
Ritmos, dinâmicas, cores, diferentes
E mais ou menos constantes.
O cipreste ainda é verde do lado esquerdo.
O céu está escuro e estende-se como um manto
O café está frio, mas tomo mesmo assim.
De dentro da casa chegam rumores de um noticiário
qualquer
A natureza pode pouco contra os hábitos sociais.

O Cesário Verde e o Caeiro acompanham-me
mas a Natureza para eles era uma metáfora,
um idílio

sexta-feira, 29 de julho de 2011



"Eu hoje estou cruel, frenético, exigente;
Nem posso tolerar os livros mais bizarros.
Incrível! Já fumei três maços de cigarros
Consecutivamente

Doi-me a cabeça. Abafo uns desesperos mudos
tanta depravação nos usos, nos costumes.
Amo, insensatamente, os ácidos, os gumes
E os ângulos agudos
........................
Cesário Verde
Lisboa 1877

sábado, 23 de julho de 2011


"Pessoas loucas como eu não vivem muito, mas vivem como querem."
Amy Winehouse

Morreu a Amy Winehouse. Soube agora pelas noticias. Morreu a Amy Winehouse e levantam hipoteses…
como se não soubessem que ela ia morrer mais tarde ou mais cedo e quais as razões. Consigo ainda ouvi-la cantar ao longe e parece-me bem, muito bem mesmo.

domingo, 17 de julho de 2011

Pintura Japonesa

Fim de semana em Paredes de Coura. Chuva, algum frio, um livro de viagens do Teixeira Pascoaes e poesia dramática da Natacha Sampaio, Florbela dos nossos dias.
Dos meus,em todo o caso

domingo, 26 de junho de 2011

Leituras

"Felizmente não vemos senão detalhes. Se alguém pudesse encarar uma alma até às maiores profundidades, e ver ao mesmo tempo de que ternura, de que ânsia, de que desespero e de que tempestadades essa alma é capaz, nunca mais podia desviar os olhos desse espectáculo. Fosse ela a minha alma ou a tua alma. Era o mundo todo, era o universo. Era Deus."
Raul Brandão "´Húmus"

sábado, 25 de junho de 2011

“É um erro supor que o homem ocupa um espaço limitado no universo: cada homem vai até ao interior da terra e até ao âmago do céu. A parte de cima foi cortada, mas o que resta da alma é um poço sem fundo. Uma obscuridade. Por vezes fala a lei e o hábito. Intrometem-se coisas abjectas a que não sei o nome. Agora é a vez do impulso – agora é a vez do interesse. A mania também tem os seus direitos. De mais baixo ascendem ordens que se não chegam a formular. Desço mais fundo no poço e encontro restos sórdidos e candura. Por baixo sonho – por baixo fragmentos e gritos…”
Raul Brandão – “Húmus”

sábado, 4 de junho de 2011

LEITURAS

"----------------------------------------------- creio que a leitura
é o acto sexual por excelência. Penetra,
atravessa, transubstancia. É o órgão dos
carismas do viator-faber. Sempre a mística
os quis separar do seu órgão - o que teve
efeitos terríveis - admitindo, todavia, que
carismas e união com Deus não eram
sinónimos. Exactamente como não são sinónimos
sexo e amor. São potências, sabores, forças experientes e eficazes.
Era importante que permanecessem no seio da bênção.
Mas todos os carismas foram dados ao humano
Jardim do Éden. Separá-los do seu órgão é enfraquecer
o livre arbítrio. Eram eles que pairavam à superfície das águas."

"se a procura da beleza não se inscrever nessa potência para a transformar em ágape, haverá belo que vibre no humano?
Haverá vontade esclarecida? Vi-me sentada à beira da água."

Maria Gabriela Llansol in "Inquérito às quatro confidências".

terça-feira, 26 de abril de 2011


“25 de Abril Sempre!”
Eram praí uns trezentos. Tenho uma certa dificuldade em quantificar massas humanas mas não devo de estar muito enganado. Aliás não sou só eu que tenho esta dificuldade, basta ver as diferenças de cálculo quando se trata de avaliar o número de pessoas que estão em manifestações politicas. Os números do governo são uns, os da polícia são outros e os das organizações que as promovem outros ainda.
Eram praí uns trezentos.
Mais mulheres que homens e algumas crianças. Adolescentes não se viam e a média de idades devia rondar os quarenta e daí para cima. Ou para baixo, depende do ponto de vista.
Os carros de apoio e alguns sujeitos da organização através de megafones, gritavam as palavras de ordem de sempre, especialmente “25 de Abril sempre, Fascismo nunca mais”. Nas esquinas grupos de pessoas observavam o cortejo. Turistas de máquinas em riste, disparavam satisfeitos com o espectáculo. Anacrónico em todos os seus elementos deve-lhes ter trazido lembranças de um passado remoto.
A verdade, o dramático, é que manifestações destas, principalmente nestes moldes se tornaram anacrónicas e sem qualquer tipo de eficácia a não ser do próprio espectáculo. Espectáculo em directo para quem participa ou observa e espectáculo em diferido pelas televisões. Só existe enquanto espectáculo.
Os manifestantes dirigiam-se à Avenida dos Aliados. Lá devem ter havido discursos e mais palavras de ordem e palmas e apupos.
Os desesperados não estavam lá. Uns estariam a trabalhar, outros a procurar em livros teorias que lhes sustentem a razão, a maior parte a ver televisão ou na net.
25 de Abril a partir de uma esquina, no Porto.

sábado, 26 de março de 2011

Neste sábado cinzento e humido uma dor de dentes fez com que me concentra-se todo em mim, esquecendo as dores do mundo, do povo portugues a esvair-se, do cheiro a napalm nos céus do Japão, do massacre cobarde a Kadafi, da politica de miséria nacional. Peço muita desculpa mas doem-me os dentes, agora. Amanhã será domingo todo o dia e se tudo correr bem carregarei a minha impotente solidariedade para com todos os problemas da vida.

quarta-feira, 23 de março de 2011

quarta-feira, 9 de março de 2011

Muito, muito pouco, muito gordo, muito fino ou ninguém.
Estranhos com faces como as costas de uma tachinha.
O exército correndo através de ruas de sangue,
acenando com garrafas de vinho.
Atirando e violando as virgens.
Ou um homem velho num quarto barato
com uma foto de Marilyn Monroe.

Há uma solidão nesse mundo tão grande
Que é possível vê-la em câmara lenta,
Nas mãos de um relógio.

Pessoas tão cansadas, mutiladas por amor,
Ou pelo não amor.
As pessoas não são boas umas com as outras
Os ricos não são bons com os ricos
E os pobres não são bons como os outros pobres.

Nós estamos com medo.
Nosso sistema educacional diz-nos que todos nós
podemos ser esses malditos vencedores.
Nada nos foi dito sobre os marginais ou os suicidas.
Ou o terror de uma pessoa que agoniza sozinha.
As contas vão balançar.
As nuvens serão nuvens e o assassino decapitará uma criança
como se desse uma mordidela num cone de sorvete.
C. Bukowski

quarta-feira, 2 de março de 2011

"Descobri`há muito tempo que é a ociosidade que engendra todas as nossas virtudes mais suportáveis: a contemplação; a equidade; o deixar em paz os outros. Acima de tudo a boa digestão, mental e fisíca. A inteligência de concentrar a nossa atenção nos prazeres da carne: comer; defecar; fornicar e sentar ao sol. Não há nada melhor, nada que se possa comparar no mundo, no pouco tempo que vivemos a: respirar, estar vivo e sabê-lo."
William Faulkner