sábado, 12 de dezembro de 2009




"Na "Mensagem" não está explícito, mas em textos reflexivos está explícito que Portugal não é Portugal, esse pedaço extremo ocidente do continente europeu. Portugal é o sonho que teve, as viagens que fez e o modo como espalhou a língua pelo mundo.

Uma outra coisa que não gosto dos linguistas é quando alguns dizem que deveríamos deixar de chamar a língua de português. Não gosto disso. Acho que falamos português.

Veja bem, Portugal é um país da Europa. Agora toda a economia do Ocidente está em grande crise menos a do Brasil, mas até aqui o crescimento da zona do euro fez com que Portugal voltasse a olhar para o Brasil como que de cima para baixo. E eu gostava disso. Quanto mais Portugal se afirma, mais leva o Brasil no bojo, não tem outro jeito, e vice-versa. E também os outros países de língua portuguesa. Para mim, é óbvio.

Uma vez eu estava numa boite no Rio, havia uma festa para o lançamento, e chegou um grupo de garotas muito bonitas, pareciam umas cariocas bonitas. Chegaram falando comigo. E a zona sul do Rio, na verdade, é muito pequena. E eu: "Puxa essas meninas tão bonitas, e eu nunca tinha visto em lugar nenhum, incrível." Com a curiosidade, puxei mais conversa, e notei então que o sotaque carioca era forçado. Pensei: vieram do sul e estão fingindo que são cariocas.

E eram portuguesas. Quando me revelaram tomei um susto. Estavam ali fazia uma semana, pela primeira vez, e falavam como brasileiras se quisessem, de tanto verem novelas. E não eram meninas desavisadas, a roupa era elegante, eram de alta classe média, interessantes. Fiquei pensando: "Que beleza. Para onde quer que vá Portugal, isso vai."

Nunca mais vai sair do espírito português o que entrou nele pelas novelas da TV Globo. Nem quero falar na música popular, basta-me isto agora, porque a música popular faz muito mais tempo que trouxe muito, levou muito para África e trouxe muito para Portugal.

Portugal pode ir onde for. Nenhum outro país da Europa tem essa convivência com o Brasil e leva naturalmente isso. Então, a língua que falamos chama-se português."

11/12/09 Caetanho Veloso (Lisboa)